Vale a pena ser velho?

Há dias em que estamos mais sensíveis e por consequente afloramos melhor as ideias levando-nos a uma reflexão cuidada e mais precisa. Os nossos olhos passam tantas vezes pelas mesmas imagens a cores, mas ignoramos como fossem a preto e branco e por isso não nos transmitindo o real valor do objecto. Falo em objecto, porque às vezes são tratados já como um velho objecto que está para ali jogado. Falo então nos objectos que são todos aqueles idosos que precisam ou não de cuidados do próximo.

Tenho a sorte de ter ainda 2 avôs e uma avó, mas só um com 92 anos precisa de cuidados. Foi mesmo por ele que voei até essa classe que representa hoje para muitos um estorvo.
Tentei perceber o que sentem aqueles idosos que chegam perto do limiar da vida, o que pensam eles de si mesmo e o que realmente querem. No caso da minha avó, uma jovem, pelo menos pela forma que se mostra a todos os dias que nascem. Já o meu avô, o seu marido, neste momento já numa queda acentuada na sua forma, mas ainda aí para as curvas. Finalmente o de 92 anos que praticamente não anda. Olhei para as suas mãos que me recordaram os trabalhos que fez, quando exercia a profissão de carpinteiro, e hoje, com peles envelhecidas e quase imóveis.

Sei que com a idade as ideias vão-se tornando mais fortes, só não sei, é se com o avançar da idade as ideias se tornam mais ofuscas e mais turvas e aí desejarmos o que nunca desejámos... o fim dos dias. Acho que há um momento em que eles se sentem a mais vendo que a rotina é a mesma e se houver maus tratos mesmo só verbais, aí inconscientemente querem o fim do tormento. Mas no fundo ninguém gosta de deixar esta pequena bola redonda e azul porque quando lhe digo...

— Está aí mais um Natal.
— Já não chego lá.
— Não chega? Chega a este e a mais.
— Sim, já agora mais este depois já chega, já estou cansado. Que ando aqui a fazer?

E estas palavras repetem-se de ano para ano porque viver é bom de mais. Viver é a razão de termos nascido e por isso temos de manter sempre essa chama que nos ilumina e que nos mantém bem acordados para a vida. Quanto aos maus tratos que lhes são dados, são uma das razões para que pensem em deixar esta vida, porque a vida dessas pessoas nesse momento, se reduz a pouco, e o pouco carinho que lhes prestam faz com que esse pequeno mundo se reduza a pó.

Não compreendo como filhos podem olhar para os pais como simples objectos que estorvam em casa quando eles próprios foram a razão deles existirem. Claro que há casos e casos, idosos que precisam de cuidados 24 horas e a família não tem como conseguir isso, mas não falo nessa questão mas sim na que vai na nossa cabeça, na vontade de nos livrarmos de um estorvo.

Um corpo que tem uma função durante uma vida e que no fim é imprestável, que é recusado pelas outras vidas é um acto miserável pela parte de quem tem esse acto e esse pensamento.

Por Paulo Cadeiras em 09-09-2009